SCENE 1
Aqui vamos nós outra vez... Como é que é possível
que não consiga aguentar uma noite inteira na cama. No fundo estou exausta de tanto
procurar. Porquê procurar? Vivemos nesta expectativa da procura de alguma coisa
que na verdade nunca vamos encontrar. Será? A única verdade é aquela à qual
queremos fugir. E por isso andamos e andamos e andamos e continuamos a andar...
Acabamos por deixar-nos cair naquele
buraco negro que engole todos os resquícios dessa verdade monumental. Será
inevitável? Caramba, será mesmo? Talvez devêssemos deixar de procurar aquilo
que já sabemos que vamos encontrar, ou não? Convencemo-nos de que não, de que
vamos atingir a fantasia que alimentamos na nossa cabeça. Procuramos a felicidade,
mas porquê procurar algo que temos de ser nós a construir? E se na realidade
essa felicidade for exactamente aquilo que não esperamos que seja. E se o
cliché de que a nossa vida não vai ser nada daquilo que planeámos está mesmo certo?
E se de repente tudo aquilo em que acreditamos, todo o caminho que projetámos
até agora forem apenas ilusões? Olhares que pensámos que fossem mudar as nossas
vidas e transformá-las naquilo que tínhamos imaginado mas que afinal.... Não...
Não chegam, não são, não se revelam. Afinal, para onde foram esses planos? Será
que estamos continuamente à procura de algo que já aqui está. Andamos e andamos
e andamos. Mas afinal é aqui. Já chegámos. Quando duvidamos de tudo. Quando na
dúvida estamos bem, é de certa forma reconfortante. É a nossa zona de conforto.
Deixar de procurar e aceitar de uma vez por todas que já chegámos – isso sim é
coragem. Bolas. Quando é que sabemos que hoje é o dia? O dia em que nos
apercebemos que não temos como fugir ou desejar, temos apenas de estar, de
permanecer, de confiar e assentar no imenso poder que é a quietude. Mas talvez isso
seja entrar na maré como todos os outros? Ou não, ou não. Ou talvez só precise
de uma bica escaldada, de um cigarro e de ver estes corpos quase adormecidos a
pairar pelas ruas Lisboetas. Pode ser que seja desta que consiga sentar-me à
frente da merda da tela do computador e espalhar letras numa folha em branco. Talvez
até façam sentido. Talvez não sejamos feitos para aquilo que tínhamos planeado.
Sinto-me apenas dúvida. Será esse o destino final? Tal como aquela nuvem de fumo
pela qual quase que mataria agora. Calma, pode ser que chegue lá. É a coragem para parar de buscar. Que
paradoxal. Deve ser esse o caminho.
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